quinta-feira, 15 de abril de 2010

Refém das Idéias - Estréia de Gracco Oliveira

Poetas jovens deixaram de ser comuns, o que parece ser sintomático e apontar para problemas em que Gracco toca.
Essas as duas primeiras surpresas imediatas: os 20 anos do autor e sua criticidade múltipla.
Os poemas de Gracco operam bastante pela ironização de chavões ao invertê-los demonstrando a fragilidade esquemática de suas afirmações. Aqui “A Prece” diz “não nos deixeis / cair em tentação / e livrai-nos da religião / amém!”; “o Ministério da Saúde adverte / mentira faz mal ao caráter”; e duvida-se que “no princípio era o verbo?”.
Estamos, em boa parte do livro, diante do poema-joguete, do verso-tirada, herança (consciente?) da poesia de desbunde setentista.
Outras semelhanças com os desbundados são o sintetismo e o radicalismo das opiniões.
Também é grata surpresa encontrar no autor, além de um pungente lirismo – emocionante em diversos momentos – uma anti-poesia ousada, menos impositiva que Marianne Moore ou Kaváfis, mas mais despojada, narrativa e em sutil equilíbrio, talvez bandeiriano: “Dizem que ele ameaçou o motorista - / por esse não ter parado no ponto – dias / antes de ser atropelado". Em alguns poemas o combate ao cânone imagético ocidental é direto: “As janelas não matam a sede. / O infinito exige, no mínimo, / uma varanda”
A última parte do livro, que graficamente não se separa das demais por nenhuma demarcação, contém as páginas menos consistentes/empolgantes de Refém das Idéias. Temos poucos Poetas políticos de maneira geral, e Gracco perde-se um tanto nessa velha empreitada – em parte pela visão tradicionalista e generalizante (apesar de sua aparente pessoalização do marxismo) e em parte porque política, ao menos a macropolítica a que ele se refere, não é assunto – não me desculpem os opositores – muito poético.
Há ainda que se comentar o caso dos sonetos, que surgem num grupo de 5 no livro. O soneto por si só perdeu prestígio e primazia há pelo menos um século. O que ainda lhe resta de interessante sãos as poucas transgressões discursivas (visto que formalmente está encerrado (?)), como as propostas por Glauco Mattoso. No caso de Gracco servem no mais para tornar o livro mais diverso, mais pós-moderno do que sem eles seria.
Refém das Idéias é raro em vários sentidos: por existir, publicado, num país (numa cidade!) em que bons livros viram pó ou qualquer coisa jamais lida; por ser autoral entre uma onda (inclusive virtual, e espetacular no atual retorno dos sarais) de plágio compulsivo coletivo; por ser uma aposta, ainda – o que confirma sua revisão assumida por Reni Adriano.

2 comentários:

  1. Li o livro e gostei, gostei muito das brincadeiras com a palavra, poesia também deve não ser levada a sério demais. E quando brincamos, costumamos ser mais autenticos.

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  2. Que surpresa boa, mano! Muito obrigado, cara, por ler, pensar e criticar esses meus negrumes.

    Marquemos uma gelada dia- noite- desses (as). rsrs.

    Um abraço pra ti.

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